Sábado, 26 de Abril de 2025
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Arlete Sepúlvida: Uma voz de determinação e resistência contra o racismo

Nesta entrevista exclusiva, Arlete Sepúlvida aborda questões profundas, como o enfrentamento do racismo em uma sociedade que ainda lida com suas feridas históricas.

19/03/2024 às 10h02 Atualizada em 19/03/2024 às 11h56
Por: Da Redação
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Arlete Sepúlvida: Uma voz de determinação e resistência contra o racismo

Arlete Sepúlvida, uma mulher multifacetada, com uma trajetória marcada por determinação, superação e um sorriso sempre presente no rosto. Nascida em Oeiras, aos 45 anos, Arlete carrega consigo uma bagagem de experiências que a tornam uma figura inspiradora não apenas para as mulheres negras, mas para todos que buscam enfrentar desafios com coragem e determinação.

Com uma formação em Administração pela UESPI/UAB e uma lista de habilidades que incluem ser Assessora de Políticas Públicas, Radialista, Locutora, Cerimonialista, Mestre de Cerimônia, Apresentadora do YouTube, Atriz de Teatro e Cinema, além de seu engajamento como presidente do Conselho Municipal da Mulher e como conselheira no Conselho Municipal de Cultura de Oeiras, Arlete é uma verdadeira força da natureza.

Nesta entrevista exclusiva, Arlete compartilha suas experiências, desde suas primeiras incursões no teatro até sua recente incursão no cinema. Ela também aborda questões profundas, como o enfrentamento do racismo em uma sociedade que ainda lida com suas feridas históricas.

Com uma voz carregada de resiliência e esperança, Arlete revela sua visão sobre a evolução do combate ao racismo, destacando os desafios enfrentados em Oeiras e em todo o país. Sua mensagem é clara: a luta contra o racismo é constante e requer ação coletiva e conscientização.

Mergulhe na história inspiradora de Arlete Sepúlvida, uma mulher que desafia estereótipos, quebra barreiras e ilumina o caminho para um futuro mais inclusivo e justo.

 

Quem é Arlete Sepúlvida? Conte um pouco da sua história.

Sou uma mulher negra de 45 anos, mãe de dois adolescentes, bacharela em Administração pela UESPI/UAB, Assessora de Políticas Públicas, Radialista, Locutora, Cerimonialista e Mestre de Cerimônia, Apresentadora no YouTube (offline, no momento), Atriz de Teatro e Cinema, Presidente do Conselho Municipal da Mulher no município de Oeiras e Conselheira no Conselho Municipal de Cultura de Oeiras, além de Militante no Movimento Negro (Coletivo Negros e Negras de Oeiras e MNU). Sou natural de Oeiras, Piauí.

 

O que te inspira a sempre estar com esse sorriso no rosto?

Não sou uma pessoa rancorosa, nem guardo mágoas, pois sei que isso não faz bem a nenhum ser humano. Embora enfrente vários problemas, como todo mundo, não perco tempo choramingando ou reclamando da vida; em vez disso, resolvo. Tenho pressa de viver, o que me torna uma mulher elétrica na maioria do tempo. Essa inspiração vem do foco que tenho em alcançar meus objetivos. Sonho muito e a cada conquista percebo que sou capaz de ir muito mais além, então continuo sonhando.

 

Você certamente é uma mulher que inspira muitas outras. Você tem noção disso e o que isso representa para você?

Inicialmente, não tinha essa noção, mas ao longo da minha trajetória, recebi alguns depoimentos de gratidão, o que me surpreendeu e emocionou. O convite para ser uma das mulheres homenageadas em um evento realizado pela Prefeitura de Oeiras, através da Secretaria de Assistência Social, Saúde, Educação e Cultura, no projeto Mulher + Bela, “Eu sou uma mulher de sucesso”, em março de 2023, me trouxe essa noção impactante. Receber a homenagem foi muito especial, e ainda mais significativo foi o incentivo que recebi da minha família, meu maior tesouro. Isso representa muita responsabilidade para mim. Em minhas palestras para mulheres, costumo dizer: “Ninguém sabe tudo. Estamos o tempo todo aprendendo, ensinando e aprendendo”.

 

Como surgiu o interesse pela comunicação, em especial o rádio?

Desde muito jovem, entendi o poder da comunicação. Falar sobre este instrumento de comunicação que é o rádio é como brincar com o imaginário. A magia do rádio é como uma viagem para um mundo de sonhos e emoções. Feche os olhos e deixe-se levar pelas ondas sonoras que trazem consigo histórias, músicas e vozes que ganham vida. Ouvir rádio é como ter um bom papo com um amigo.

 

 

O cerimonial é uma das suas áreas de atuação. Como surgiu esse trabalho de cerimonialista?

Foi até engraçado. Assim que completei 18 anos, fui madrinha em um casamento. A noiva se atrasou muito e sua entrada na igreja foi inesquecível; ela correu para o altar ao encontro do seu noivo. Alguns anos depois, participei da celebração de outro casamento, onde os familiares dos noivos moravam em localidades distantes da cidade e não organizaram nada para o cortejo de entrada. Observando os argumentos do Padre e o tempo que ainda faltava para o início da celebração, liguei para um amigo e pedi que baixasse a marcha nupcial em um pen drive, que eu já estava indo buscar. Rapidamente, com a permissão de um dos padrinhos, saímos correndo para buscar o pen drive e realizar o cortejo deste casamento. Foi tão bonito que parecia que houve ensaio. Percebi então a oportunidade e busquei qualificação na área. A cada evento, um novo aprendizado. Sigo grata a cada contrato de cerimonial, seja em casamentos, formaturas, debutantes, etc. É maravilhoso fazer parte desses momentos de celebração à vida.

 

 

Você tem uma história marcante no teatro local. Que lembranças você tem do tempo em que atuava?

O teatro foi a parte mais linda da minha adolescência. Não possuíamos celulares nem redes sociais; nosso passatempo era nas tardes de contra turno escolar ou finais de semana no palco do Cine Teatro Oeiras, estudando texto, fazendo marcação de palco, rabiscando croquis. Não havia tempo ruim, e as amizades eram verdadeiras. Da Paixão de Cristo ao 24 de Janeiro, são tantas boas histórias. Mas a paixão pelo teatro começou bem antes, ainda no Pequeno Polegar, uma escola infantil administrada pela saudosa Irmã Caldas, no Frei Jordão. Foi a primeira vez que subi ao palco. Não me recordo do texto, mas guardo a lembrança do frio na barriga, o coração batendo mais forte, o olhar da Tia Zuita me encorajando quando esqueci o texto, e os degraus que subi para o palco de piso de cerâmica vermelha.

 

Recentemente, você teve uma experiência com o cinema. Conte como foi essa experiência.

A oportunidade de atuar em um grande projeto cinematográfico é incrivelmente emocionante. A sensação de estar no set, rodeada por uma equipe talentosa, e ter a chance de dar vida a um personagem em uma tela grande é uma mistura de nervosismo, empolgação e gratidão. Este momento representou a concretização de um sonho e o início de uma nova fase na carreira. Meu primeiro papel na telona foi o de uma mulher escravizada que viveu na fazenda Algodões, juntamente com outras mulheres escravizadas, incluindo Esperança Garcia. Conhecemos a vida árdua dessas mulheres. Para ficar com o aspecto abatido, cansado, maltratado, passei uma noite em claro e, no dia seguinte, dia de gravação, a equipe de trabalho também facilitou muito. São pessoas incríveis às quais guardo estima e gratidão.

 

Você, como mulher negra, certamente já vivenciou situações de racismo. Como você lida com essa questão?

Como mulher negra, trago comigo as marcas de uma luta que começou silenciosa, de um peso que não escolhi carregar. Cada olhar carregado de preconceito, cada palavra cortante como um açoite, deixou marcas profundas na minha alma. Mas não me rendo, pois em meu coração arde a chama da resistência, e em minha voz ecoa a força de todas as que vieram antes de mim. Cada passo que dou é uma afirmação da minha existência, um grito de liberdade que ecoa pelos séculos de opressão. Minha pele, meu cabelo, são um testemunho vivo da minha ancestralidade, e cada traço do meu ser é uma celebração da minha herança. Eu sou a esperança que floresce no meio da adversidade, a luz que brilha mesmo nas sombras do preconceito. Apesar das lágrimas derramadas e das batalhas travadas, ergo-me com dignidade e orgulho. Pois sei que carrego em mim a beleza incomparável da minha negritude, e nela encontro a força para seguir em frente, desafiando o racismo com amor e resiliência. Acredito que a educação é a grande parceira na luta e no combate ao racismo. É através dela que busco a justiça para que todos sejam tratados de forma justa perante a lei, sem discriminação com base na cor da pele.

 

Você crê que a sociedade está menos racista?

Sim, apesar de a todo momento vermos casos e mais casos de racismo, isso acontece porque temos mais acesso à informação. Antes, talvez fosse até pior, pois a notícia chegava com menos velocidade. É possível acreditar que a sociedade esteja menos racista. A consciência e a luta contra o racismo têm aumentado nos últimos anos, levando a mudanças significativas em muitas áreas. O reconhecimento dos direitos iguais para todas as pessoas, independentemente da sua raça, é um princípio fundamental em muitas constituições e leis ao redor de Oeiras, no Piauí, e do mundo. Existem várias evidências que indicam uma maior conscientização sobre o racismo e uma maior tolerância em relação às diferenças raciais. A luta é diária no combate ao racismo.

 

Oeiras é uma cidade racista?

Sim, assim como a maioria das cidades do nosso país. A cidade de Oeiras-PI apresenta grande desigualdade social e muitas famílias em situação socioeconômica abaixo do necessário para uma vida digna. Superar o racismo em uma cidade requer ações e políticas coletivas para promover a igualdade racial, o respeito mútuo e a justiça social. O racismo é um problema social complexo que pode variar de acordo com a experiência de vida das pessoas, a discriminação e o preconceito racial são predominantes e sistematicamente praticados por pessoas, instituições e autoridades.

 

 

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