Sexta, 14 de Fevereiro de 2025
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Mulheres que inspiram: ''Eu, Edileusa Osório, não sou parda, eu sou negra, com muito orgulho!''

Sei que o caminho percorrido pela mulher negra até a universidade não é fácil"

15/03/2022 às 10h00 Atualizada em 15/03/2022 às 10h15
Por: Da Redação
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Mulheres que inspiram: ''Eu, Edileusa Osório, não sou parda, eu sou negra, com muito orgulho!''

O Mulheres que inspiram, apresenta hoje a trajetória da professora Edileusa Osório. Mulher negra que ao longo 37 anos de magistério, serviu como referência aos seu alunos, principalmente os alunos negros: "Nas escolas que passei e até na que trabalho hoje, as crianças e adolescentes, sobretudo os negros, aproximavam-se e continuam se aproximando de mim de uma forma bastante tímida, porém carinhosa. Acredito que essa identificação comigo se dá inicialmente, por conta da minha cor de pele ser igual a deles".

Formada em Letras/Português pela UESPI e pós-graduada em Gestão Escolar pela   Universidade Federal do Piauí, ela diz saber que o caminho não é fácil: "Sou mulher, negra e professora. Desse modo, sei por experiência própria que o caminho percorrido pela mulher negra até a universidade não é fácil".

Confira a história da professora Edileusa Osório:

 

Sou Maria Edileusa Costa Osório, nasci no dia do professor (15/10), tenho 59 anos de idade e 37 anos de efetivo Magistério. Casada, mãe de três filhos e possuo quatro amados netinhos. Minha família é extremamente alegre e festeira!

Hoje, sou aposentada, porém ainda ativa, devido concurso realizado no ano 2000.

Meus pais eram feirantes e semianalfabetos (seu Enedino e dona Socorro (in memoriam), e exerceram um papel de extrema importância em nossas vidas. Eles queriam para nós, os seus filhos, uma vida melhor e diferente daquela que eles tiveram, pois sabiamente acreditavam que somente através do estudo é que teríamos chances de transformar nossa realidade.

Dos seis filhos fui a primeira a possuir um diploma universitário (orgulho dos meus pais). Uma conquista significativa na vida de qualquer pessoa, em especial quando se trata de uma mulher negra, pois infelizmente a maior parte das mulheres negras no Brasil exerce atividades ligadas ao serviço doméstico- ocupação de pouco prestígio social e de baixa remuneração salarial. Então, dessa forma, nossa trajetória se inicia com poucos recursos e muito esforço pessoal.

 

Sou professora licenciada em Letras/Português pela Universidade Estadual do Piauí (UESPI) e pós-graduada em Gestão Escolar pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Tenho muita honra em dizer que sou da primeira turma de Licenciatura da UESPI de Oeiras. Gostaria de salientar ainda, que fomos nós, com a ajuda de várias pessoas (inclusive padre João de Deus) e de inúmeras outras mãos, que conseguimos trazer a Universidade Estadual para Oeiras.

Dessa forma, percebe-se que a minha trajetória pessoal e a profissional se misturam, porque afinal de contas sou uma única pessoa. Vejo que minha formação acadêmica me possibilitou mesclar minha vida pessoal com a profissional com êxito.

Acredito que a Educação é a ferramenta central para o enfrentamento do racismo, porém não é a única. Entendo que é necessário um olhar todo especial para essa questão, porque o racismo fez e continua fazendo vítimas pelo mundo afora, inclusive no Brasil. Parece até que está entranhado, enraizado. Penso que, uma educação antirracista, se aliada, a outros mecanismos teria o poder de minimizar ou acabar, se não de vez, pelo menos gradualmente com essas desigualdades (meu sonho).

Sou mulher, negra e professora. Desse modo, por experiência própria, sei que o caminho percorrido pela mulher negra até a universidade não é fácil. No percurso de formação escolar e profissional, enfrentamos fortes situações de preconceito e discriminação social. Assim, as relações da mulher negra nos diversos setores da vida social e profissional são permeadas de manifestações de caráter racista inclusive na área da educação.

 

É importante salientar que embora o Brasil tenha tido ao longo dos anos um desenvolvimento socioeconômico expressivo, os negros - em especial as mulheres negras- permanecemos em situação de extrema desigualdade. Essas desigualdades são bem significativas, podendo ser percebidas no mercado de trabalho, inclusive na educação. A participação de negros em postos de trabalho de maior prestígio ainda é muito restrita. A mulher negra quando consegue romper com algumas barreiras do racismo e passa a ocupar posições mais independentes, mais longe da subalternidade como uma profissão de professora, por exemplo, acaba tendo de enfrentar uma série de obstáculos, precisando "matar um leão a cada dia!" É necessário, porém, avançar, passar pelas dificuldades com muita força e sempre de cabeça erguida.

A minha Certidão de Nascimento me identificava, equivocadamente, como de cor parda. Essa forma errônea de tentar "embranquecer" a população brasileira nos negou o direito de assumirmos desde cedo a nossa raça. Eu, Edileusa Osório, não sou parda, eu sou negra, com muito orgulho!

Nas escolas pelas quais passei e até na que trabalho hoje, as crianças e adolescentes, sobretudo os negros, aproximavam-se e continuam se aproximando de mim de uma forma tímida, porém bastante carinhosa. Acredito que essa identificação comigo se dá, inicialmente, por conta da minha cor de pele igual a deles. A empatia imediata e o acolhimento sempre nos trouxeram um bom relacionamento.

Iniciei minha trajetória profissional na Secretaria da Escola Normal Presidente Castelo Branco, passando para a Unidade Escolar Desembargador Pedro Sá como professora de Polivalência até a conclusão do meu Curso de Letras. Daí então, assumi algumas turmas de Língua Portuguesa no Farmacêutico João Carvalho durante vários anos. Voltei ao Pedro Sá alguns anos depois para tirar uma licença, na época já era uma escola de ensino integral. Foi aí que veio o convite do amigo professor Alberto Moraes para juntos concorrermos à gestão daquela instituição de ensino; e, foi assim que fomos os primeiros gestores eleitos daquela escola. Além dessas escolas, ainda ministrei aulas no Orlando Carvalho por um semestre e no Costa Alvarenga onde estou até os dias de hoje.

Lembro com muita saudade do corpo docente, discente e administrativo de todas essas escolas, porque em todas elas fiz amizades sinceras e verdadeiras as quais conservo até hoje. Porém, dentre elas, uma se destaca no meu coração: o Pedro Sá, Ensino Fundamental. Nós éramos um time!!!Expresso aqui o meu carinho, admiração e gratidão por aquela equipe.

Tenho uma admiração profunda pela história de vida de algumas mulheres, dentre elas várias negras, pela força e destemor demonstrados em sua trajetória. Uma delas é Antonieta de Barros, professora, jornalista, primeira deputada negra do Brasil e a primeira mulher a presidir uma sessão na Assembleia Legislativa do Brasil. Mesmo enfrentando o duplo preconceito (gênero e cor/raça), a filha e neta de ex-escravos encontrou na educação o caminho para a mobilidade social; e, representou durante anos a única voz negra feminina a ecoar na imprensa do Estado de Santa Catarina. Outra mulher de história de vida impactante e inspiradora é a Esperança Garcia, mulher negra, escravizada que teve a coragem de denunciar os maus-tratos sofridos por ela, suas companheiras e seus filhos.

 

Posso destacar também, a socióloga e vereadora Marielle Franco uma das principais vozes defensoras dos direitos de mulheres, negros e da comunidade LGBTQI+ no Brasil, que nos deixou também uma história linda de luta por igualdade. Além destas, uma menina/mulher (não negra) mas que tenho profunda empatia é por Malala, que luta pelo direito à educação feminina numa sociedade que privilegia filhos homens. Ela só queria estudar e garantir que esse direito fosse estendido a todas as mulheres paquistanesas.

Hoje as pessoas falam muito de empoderamento. É necessário sim, que nós, mulheres, negras, nos empoderemos. Que tomemos consciência de nós mesmas para sairmos da condição dessa inferioridade. Agora fica a pergunta: o que temos feito, efetivamente, para mudar esse contexto de exclusão?

E, enfim, para concluir gostaria de usar as palavras de Djamila Ribeiro: "Como negra, não quero mais ser objeto de estudo, e sim o sujeito da pesquisa."

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